2008-05-05

etudient

do Maio de 68, muitas recordações são feitas e refeitas pelo (re)visto, ouvido e lido bem para além do que à época se vivenciou, pese embora algum registo de desacatos na capital francesa e sem prejuízo do acompanhamento próximo, interessado e fascinado de alguma elite estudantil e intelectual de gerações então adultas ou perto disso

para as gerações então mais jovens, o amadurecimento trouxe outro Maio, a varar de amores

mas o de Paris de França também ficou em muito coração, onde ainda pulsa a utopia, mesmo a das oportunidades perdidas com as duras realidades do mundo que teima em não se deixar endireitar

desses tempos idos, ecoa uma anedota significativa, vá-se lá saber se verdadeira: no calor dos confrontos da estudantada com as forças policiais, estas representando o poder ultrapassado então em contradição na sociedade, os universitários gritavam sibilinos - CRS S S, ao que os iletrados para-militares respondiam - etudient ent ent !!!


observacões são bem-vindas



PS - volto à minha, com pena de não saber deixar aqui a bela melodia, que estive a ouvir e facilmente se evoca:

Maio maduro Maio/
Quem te pintou/
Quem te quebrou o encanto/
Nunca te amou/
Raiava o Sol já no Sul/
E uma falua vinha/
Lá de Istambul/

Sempre depois da sesta/
Chamando as flores/
Era o dia da festa/
Maio de amores/
Era o dia de cantar/
E uma falua andava/
Ao longe a varar

Maio com meu amigo/
Quem dera já/
Sempre depois do trigo/
Se cantará/
Qu'importa a fúria do mar/
Que a voz não te esmoreça/

Vamos lutar/
Numa rua comprida/
El-rei pastor/
Vende o soro da vida/
Que mata a dor/
Venham ver, Maio nasceu/
Que a voz não te esmoreça/
A turba rompeu

«Zeca Afonso»

2 comentários:

argumentonio disse...

sempre este magnífico endereço internetal:

http://delta02.blog.simplesnet.pt/

Anónimo disse...

Este episódio é um pormenor, mas para mim ficou marcado até hoje. Talvez em Maio, numa noite de temperatura agradável, já não sei se em 1968 ou 69, fui convidado para me juntar a uns tantos amigos do Zeca Afonso num pequeno serão. Éramos ao todo umas 30 ou 40 pessoas, de idades bastante variadas, mas irmanadas do mesmo desejo de ajudar o Zeca, que passava então por grandes dificuldades materiais. Tinha-lhe sido vedado o ensino nas escolas públicas - ele ensinava História, se não estou em erro - e mesmo nas escolas privadas o seu ingresso causaria sérios problemas aos proprietários. Restava a solução, que foi de facto praticada, de ele dar lições particulares. Era uma maneira simpática de contribuir.
A reunião, realizada no secretismo que habitualmente rodeava essas coisas naquele tempo, teve lugar numa casa semi-abandonada, junto à praia da Azarujinha, em S. João do Estoril. Pertencia ao arquitecto Câncio. O grupo que se juntou foi notável. Lembro-me do Assis Pacheco, creio que o José Carlos Vasconcellos e o Alvim também lá estavam, e do António dos Santos (Tóssan), este último um homem cheio de humor, que ilustrou e escreveu um livro que se tornou célebre na altura (ainda tenho um exemplar): Cãopêndio. Estávamos numa garage ou numa sala praticamente sem mobiliário, já não me recordo bem. O Zeca, com a sua viola, cantou, uma perna sobre uma cadeira e o papel à frente que o Assis segurava - ele não se recordava de todas as letras - as canções bonitas que conhecemos. Entre elas estava este "Maio". E também a Maria Faia e o Canto Moço. E os Abutres e tantas outras. Havia comoção natural da parte de muitos de nós. Após a natural e discreta contribuição de todos, falou-se de injustiças, mas principalmente contaram-se anedotas - nisso o Tóssan era um portento - , rimo-nos e quase chorámos. Foi uma noite diferente, das que valem a pena. Digna de Maio.
jmco