2005-05-03

humanos recursos

passou o dia do Trabalhador, algo despercebido, o domingo a absorver um desejável feriado e para mais era dia das Mães, que tudo merecem, deviam ter um dia grande 365 vezes por ano, toda a nossa vida

nos últimos anos, recentemente, o primeiro dia de Maio tem sido aproveitado para contestar a globalização, por vezes de forma irracional e mesmo violentamente - o problema das multinacionais, da descaracterização cultural, das deslocalizações, da procura desenfreada de lucro, (s)enfim... pese embora ser forçoso reconhecer e criticar a deficiente democraticidade do sistema económico mundial, facto que importa superar construtivamente e sem destruição nem caos

longe vão os tempos da festa do início das plantações da Primavera, com o entusiasmo de todos, dos trabalhadores em especial, também a poder de ancestrais ritos dos ciclos naturais, da vida e da alegria, partilhada por velhos e novos

entretanto o dia significou luta, martírio, coisa a sério, a polícia a carregar e morriam trabalhadores, desvaliam-se famílias, cuidava-se do valioso futuro alheio com o risco da própria vida, tempos

entretanto passou a memorial, homenagem, comemoração, celebração de vitórias e atitudes, sinal da dignidade ao de cima

depois passou a caso de política, sindicatos partidarizados

ainda serviu para alguma música ou para sair simplesmente à rua, encontrar gente e animação, um dia roubado ao patrão é também para esbanjar ao sol, no jardim, no relvado, no largo, na praça, na avenida, na alameda

agora já quase só dá na TV, havemos de ver dois ou três espécimes, protegidos a honorário e lancharete, em entrevista a explicar como eram os tempos em que havia manifestações ou apenas reuniões ou mesmo trabalhadores ...

pois a grãfinagem guru da megagestão só conhece "recursos", ainda lá botam, digo, implementam um H mas tudo se pode racionalizar, reduzir, flexibilizar, jametihamdito que estará para breve o acabar de vez com a obsolescência do superlativo "humanos" a qualificar inviamente tão fungíveis recursos

de nada vale argumentar que os trabalhadores não são recursos, são antes sujeitos que exercem actividades remuneradas aplicando o saber e a mão de obra de que dispõem, de forma organizada pelos gestores e em benefício da empresa ou entidade patronal

também de nada vale argumentar que os gestores não são recursos mas sujeitos que exercem actividades remuneradas de administração de bens alheios, organizando os factores de produção, trabalho incluído - esse sim, um factor - em benefício da empresa ou dos accionistas seus proprietários

e também de nada vale argumentar que os accionistas não são recuros mas sujeitos que aplicam e arriscam os seus capitais e economias, confiando em gestores que organizam as actividades dos trabalhadores

é que o que faz mover o mundo são os fundos anónimos que representam a abstracção de referência, porventura meros índices e siglas, informaticamente listados, em que accionistas, gestores e trabalhadores são vistos não como sujeitos mas meros factores

ora, tal como gestores e accionistas, o trabalhador não é um recurso nem factor

o trabalhador é um sujeito, gente, ser humano que nasce, aprende, cresce, vive em Família e em sociedade, em várias comunidades incluindo a laboral, esta importante sem no entanto esgotar a vida, o todo em que se realiza e dignifica a pessoa humana

era por isso o entusiasmo das primeiras plantações da Primavera, os factores serviam o homem, sujeito dinamizador da transformação dos recursos, titular de dignidade humana e Família para alimentar e educar

era por isso que lutavam e morriam os trabalhadores martirizados no primeiro Primeiro de Maio, queriam ser tratados como sujeitos, pessoa humana, Pais, Mães, Filhos, gente

entretanto sobreveio a alpaca mais a era digital e as business school, puro management, cavalgado a gurus de case study debruado a power point, deixam de ver gente, é tudo recursos, tal como está consagrado na apresentação web-based


trabalhadores o que seja ?

partilha, o que é ?

dia de quê ?




observacoes sao benvindas

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