2009-09-17

7 saias

abate-se uma tristeza funda: 7 miúdas perderam a vida em mais um acidente rodoviário demasiado estúpido para ser entendido

é tão difícil de entender que as notícias aparecem confusas, parecem misturar os factos, gerando inúmeros comentários contraditórios, desinformados, parvos

as vítimas mortais eram alunas de um curso de formação profissional, terminaram as aulas e iam a caminho de almoçar

deslocavam-se numa viatura comercial, de 2 lugares, na caixa de mercadorias iam 5 das raparigas, facto incompreensível enquanto fruto da decisão de 7 estudantes ao nível do 12º ano, informadas e capazes de pensar

mas agiram sem cuidado algum com a sua própria segurança, com a de terceiros, com a dor inimaginável dos seus entes queridos e a perplexidade de todos

um acidente é sempre resultado de uma acumulação de factores desfavoráveis e numa tragédia como esta a dimensão dos danos ultrapassa em muito o nível de riscos admissíveis

regra da gestão de risco é admitir à partida que podemos perder tudo, mas o certo é que conduzimos as nossas vidas gerindo riscos, pequenos, grandes ou desconhecidos, sendo que a medida de risco aceitável (que estamos dispostos a correr ou que julgamos ser capazes de gerir) depende muito do bom senso, da informação disponível e da vontade de actuar dentro dos limites do razoável

a legislação de matérias rodoviárias está recheada de avisos, recomendações e sanções, algumas bem pesadas, aplicáveis a condutores, fabricantes, proprietários, oficinas e vendedores de automóveis - mas a quem concebe, autoriza, constrói, fiscaliza, repara uma estrada é mais difícil responsabilizar

na realidade, ninguém tem a culpa toda - o que é bem diferente de ninguém ter culpa nenhuma - e não há notícia de alguém ter ido preso por ter feito uma estrada armadilhada com uma curva perigosa, até porque ou a antiguidade da estrada se perde nos confins dos tempos e os autores não são já responsabilizáveis ou a estrada é nova e veio melhorar (tornar menos perigosa) a que existia...

as declarações ouvidas ontem, face às duras críticas sobre a via onde ocorreu tão fatídico acidente e se repetem vários outros, são muito elucidativas: conscientes do perigo provocado pelo mau traçado da estrada, jametinhamdito que "está adjudicada uma rotunda" e que "se tem investido em sinalização"

ora, o condicionamento da velocidade (causa de muitos acidentes mas, sobretudo, na origem da extensão e do agravamento dos danos) e os avisos de perigo são importantes mas o principal é a eliminação dos factores de risco

a má concepção e a má construção do traçado das vias, a falta de bermas seguras, as curvas abruptas, as indicações "em cima", os cruzamentos nivelados, as faixas sem separação, a inclinação do piso, a falta de visibilidade da via, etc.

também a poder de "avisos" se desculpam os responsáveis da REFER apesar da repetição absurda de acidentes em cruzamentos de estradas com a via férrea, em passagens de nível que subsistem e persistem e perseguem vidas numa perda absurda de tão inútil e cada vez mais estúpida

bem assim nos casos de queda de falésias que vitimam veraneantes e pescadores, quando o acesso deveria ser interditado, fisicamente impossibilitado, e não apenas objecto de serôdios avisos de perigo

até quando nos sujeitamos a este quadro mental de subdesenvolvimento que nos dispensa de exigir, exigir, exigir, a começar por nós próprios ?


observações são bem vindas
;-<<

3 comentários:

Anónimo disse...

Li com atenção, António. Não sei o que hei-de responder. Venho agora do funeral arrepiante de um rapaz de 30 e poucos anos que conheço desde miúdo. Ele ia sozinho ao volante da pequena camioneta em que fazia o transporte de vidros e despenhou-se de uma altura considerável, junto à N-10. Não foi excesso de velocidade. Os humanos, condutores, construtores de estradas, autoridades não são perfeitos. O nosso país não enfileira entre os primeiros em matéria de desenvolvimento. E, António, embora as exigências que bem-intencionadamente aponta sejam correctas e necessárias, em face da morte tudo soa apavoradamente a fait divers. Também as auto-estradas ditas "de segurança" estão cheias de acidentes...
jmco

argumentonio disse...

sem dúvida!

nada apazigua a dor perante a tragédia e o pesar de vidas perdidas :<

Sofá Amarelo disse...

E a caravana segue impune... sim, já se falava em rotundas, sinalizações, etc, exactamente como no acidente ferroviário onde foram vítimas também uma mão cheia de pessoas... e vêm dizer: 'sim, a passagem desnivelada já estava adjudicada, só tem um atraso de vários anos... que país é este onde caem pontes, onde se morre nas praias ??? E a banda continua a passar...

O melhor artigo que li sobre o assunto...

Abraço forte!